quarta-feira, 19 de setembro de 2007

O CONCERTO DOS POBRES




Dizia Arthur Choupenhauer, ainda que tudo desaparecesse a música subsistiria. Nada podia ser mais verdadeiro que esta afirmação, basta olharmos entre outras coisas para o actual momento da conjuntura política na Guiné-Bissau. Os campos murcharam, o verde de esperança é substituído pelo deserto do humano sofredor. As almas que outrora cantavam e faziam cantar estão, literalmente, a sucumbir pelo sufoco do fumo de um país drogado, mas, mesmo assim, é audível, ainda que de longe, uma melodia fúnebre de gente que luta, desesperadamente, contra o tempo fabricado pelo absurdo do sofrimento.
Este país que está de luto há mais de trinta anos, sempre conseguiu formatar o registo melodioso do seu tempo fúnebre, através de um padrão que ele mesmo construiu na noite da sua resignação e da venda do seu ethos. Na longitude da noite em que se mergulhou para nunca mais sair, pelo menos aquilo que dá a entender, a curto prazo, ofereceu aos guineenses um padrão de conduta rítmico que consiste em nunca falarem mas desentenderem, constantemente, e quanto mais, melhor; melhor pelo menos para o ambiente que se quer eternamente mortífero.
No meio desta orquestra fúnebre há um triunvirato que está a pôr em causa a arquitectura construída minuciosamente para a destruição. Trata-se do senhor primeiro-ministro, Martinho Ndafa Cabi, o ministro do Interior, o senhor Baciro Dabo e o eterno general presidente, o ditador João Bernardo Vieira Nino. No cerne da destruição da música fúnebre está o enigma da nomeação do senhor Baciro Dabo. Esta figura mítica do Governo, uma espécie de padre de Salém cuja origem ninguém conhece. Na verdade, é abusivo dizer que ninguém conhece a sua origem uma vez que a comissão que negociou a presença do PRS de Kumba Ialá sabe muito bem a origem e a finalidade do senhor Baciro Dabo no Governo. A confusão consiste no facto de, até agora, o antigo braço direito do Dr. Kumba Ialá, o senhor I. Sori Djalo não ter aparecido ao público para dizer quanto dinheiro recebeu de “Nino” Vieira em troca de aceitação do nome de Baciro Dabo no Governo. Enquanto não o faz o concerto dos pobres continua, a música também, mesmo depois do desaparecimento de toda credibilidade do Governo.

3 comentários:

Anónimo disse...

Caro Valentim.
Porque será que a circunstancia de Baciro Dabó e as suas entidades empregadoras, Nino e Kumba, só aparecem em dois blogs sobre a Guiné Bissau neste momento crítico em que Baciro manipula nitidamente a (tal Nino no seu regresso) à espera que lhe seja otorgada a insubstituibilidade quer pelo poder quer pelo eleitorado?
O que se terá passado nos encontros secretos durante a passagem da comitiva guineense por lisboa, que amansou os mais ferrenhos críticos?

Anónimo disse...

Muito bom artigo, só não sei se os guineenses percebem esta elevação cultural.

Anónimo disse...

O que mais me incomoda é o silêncio ensurdecedor do líder do paigc.
O que me assusta e me indigna como cidadão e simpatizante do partido de Cabral é esta ausência extraordinária do líder do paigc na vida política nacional.
O refúgio ao silêncio do Sr. Carlos Gomes Júnior não é mais de que um sinal de cobardia e medo do seu inimigo João Bernardo desde que este mandou prendê-lo depois da inocente acusação pública que fez a sua pessoa.
Concordará o líder do partido com o rumo que este governo está a seguir?
Não diz nada porquê?
E quando aparece, aparece com voz mansinha a pedir reconciliação interna no partido e no país, porquê?
Não Sr. Cadogo. Não é isso que se espera de um líder do partido de Cabral.
Queremos um líder forte, corajoso, interventivo, competente e capaz, meu Senhor.
Queremos um líder que não foge para a sede da ONU ou qualquer outro organismo internacional com medo de nada e de ninguém.
Não queremos um líder fraco mas um líder “matcho” tal como sempre foram os líderes e homens do paigc.
Que custe o que custar, um líder do paigc tem que ser muito mais do que isto que temos e estamos a assistir agora no partido. O senhor tem medo do Nino Vieira e não devia ter, tal como não teve medo do Kumba Ialá e os seus militares.
E o congresso é para quando?
Não estará o nosso líder apenas agarrado a cadeira do poder como forma de se defender das eventuais acções do general contra a sua pessoa?
Avizinham-se aí novas eleições e constata-se que temos um partido à deriva; totalmente dividido, sem definição, inconsistente, incoerente nas expectativas de um povo que espera e desespera por dias melhores e estamos perante total ausência da luzinha “verde” ao fundo do túnel.
Até quando Camaradas?